sábado, 15 de outubro de 2011

Film Wars: Comercial VS Independente


Há dois anos atrás, a cerimónia dos Óscares ficou marcada por um incidente curioso e deveras sintomático do ambiente que se tem vivido em redor da Sétima Arte nos últimos trinta ou quarenta anos. Nessa cerimónia que ditou um confronto titânico entre “Avatar” e “The Hurt Locker”, um dos produtores do filme realizado por Kathryn Bigelow acabou desclassificado da categoria de Melhor Filme para a qual estava nomeado. E porquê? Porque esse produtor acordou um dia com a brilhante ideia de maldizer o colosso cinematográfico de James Cameron, sugerindo aos membros da Academia que votassem na obra de Bigelow como forma de lutar contra o cinema corporativo e puramente comercial, do qual “Avatar” era e ainda é um dos expoentes máximos. Convém neste momento lembrar que “Avatar” era um menino bonito dos grandes estúdios norte-americanos, enquanto que “The Hurt Locker” era um daqueles rebentos que tem de ultrapassar furacões e tempestades para chegar a algum lado. O épico de James Cameron carregara às costas um orçamento extraordinário e contara com a colaboração bem simpática das maiores distribuidoras para marcar presença num número recorde de salas e monopolizar o mercado cinematográfico. O filme de guerra de Kathryn Bigelow fora produzido com recursos bem mais escassos e tivera que passar as passas do Algarve (muitos festivais e afins, entenda-se) para chegar ao grande público, quase tendo que suplicar para que as audiências lhe conferissem um pouco de atenção. Muito basicamente e em língua mais corriqueira, “Avatar” era um produto cinematográfico claramente comercial, ao passo que “The Hurt Locker” era uma obra do mais independente que pode haver. Duas faces completamente opostas do cinema norte-americano em pleno duelo na cerimónia de prémios mais importante do mundo, portanto.
Ora, é certo que o povo tende sempre a torcer pelo coitadinho nas mais variadas ocasiões, puxando sempre pela ventura do David em detrimento do Golias. Porém, será correcto (tanto da nossa parte como do produtor aqui referido) tomar uma posição firme e inequívoca a favor do filme independente, seja ele qual for, apenas e só porque o filme comercial já tem apoios de sobra? Obviamente que não. Mas o grande problema é que muitos julgam que sim, principalmente os detractores crónicos do cinema norte-americano. A julgar pelas discussões entre acérrimos cinéfilos que presenciamos nos mais variados chats e blogs da internet, quase poderíamos dizer que a Sétima Arte se encontra em estado de guerra. Viramo-nos para um lado e depressa encontramos quem defenda que só os blockbusters megalomaníacos são dignos de um visionamento. Viramo-nos para o outro e logo avistamos quem diga que só o que é feito em terras áridas da Checoslováquia merece o título de “cinema de qualidade” ou “verdadeiro cinema”. Muito raramente encontramos alguém que defenda um óbvio equilíbrio entre as partes e é uma pena que assim seja. Pois tanto o cinema comercial como o independente têm os seus prós e contras. É verdade que a grande maioria dos blockbusters tem a alma cinematográfica de uma galinha depenada, esquecendo a importância de uma narrativa sólida e empolgante para somente dar valor aos lucros do box-office. É verdade também que os filmes independentes tendem a apresentar-nos histórias bem mais arrojadas e originais, precisamente porque não sofrem a castração criativa de produtores mais casmurros que uma mula. Mas não podemos esquecer-nos que muitos blockbusters deixam filmes independentes a andar pelas ruas da amargura.
O que realmente deve importar é a qualidade e a relevância da história que nos é apresentada. Se a história for decente e o produto final minimamente competente, comercial ou independente é uma questão que deve ser relegada para um plano secundário. Antes de mais nada, o verdadeiro cinéfilo deve avaliar a história que foi convidado a assistir, bem como a forma como ela foi contada. Se os pontos estiverem todos nos is, então não há (ou não deveria haver) razão para desconfiarmos de um ou de outro tipo de cinema. Ainda há pouco tempo vi alguém dizer que “The Curious Case of Benjamin Button” tinha algum valor cinematográfico, mas que nunca poderia ser um bom filme porque tinha alcançado receitas do box-office positivas. Quer dizer, passámos agora a avaliar a qualidade de uma obra pelo seu desempenho económico? Não me parece que faça muito sentido, a menos que só desejemos alimentar o nosso ego com a ideia de que só apreciamos coisas que só foram vistas por mais duas ou três pessoas em todo o mundo…
Como tanta coisa neste mundo, no equilíbrio é que está a virtude. Não podemos puxar exclusivamente por um lado ou pelo outro. Seríamos todos mais felizes se admitíssemos que tanto o cinema comercial como o independente possuem os seus podres e probidades. Porque, pelo menos na arte, não é o dinheiro que deve ditar as regras. E porque a Sétima Arte não está, julgo eu, em guerra consigo própria.

0 comentários :

Postar um comentário