quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Crítica - Wall Street – Money Never Sleeps (2010)

Realizado por Oliver Stone
Com Michael Douglas, Shia LaBeouf, Carey Mulligan, Frank Langella, Josh Brolin

O lado mais sombrio de Wall Street volta a ser abordado em “Wall Street – Money Never Sleeps”, uma sequela do aclamado “Wall Street” (1987), um filme que nos apresentou o icónico Gordon Gekko, um dos correctores/ stock traders mais astutos e vilanescos da Bolsa de Nova Iorque que no final de “Wall Street” foi condenado por fraude e extorsão mas que após quase oito anos de prisão é finalmente posto em liberdade. Gekko é um homem transformado que abandonou a sua ideologia (Greed Is Good) e que agora tenta reparar a frágil relação que tem com a filha, Winnie (Carey Mulligan), no entanto, esta não está muito interessada em se aproximar novamente do homem que destruiu o seu lar até porque tenta reconstruir a sua vida com o seu noivo, Jake Moore (Shia LaBeouf), um jovem brilhante e ambicioso que trabalhava para a Keller Zabel Investments (KZI), uma empresa altamente rentável que era liderada por Louis Zabel (Frank Langella), um magnata financeiro que subitamente se viu forçado a vender a rentável KZI a Bretton James (Josh Brolin), um impiedoso homem de negócios que pressionou Louis a vender a sua empresa por um valor insignificante. Jake ficou profundamente abalado com a polémica venda da KZI e decide procurar Gekko com quem acorda uma troca de favores, assim sendo, Jake promete ajudar Gekko a lidar com Winnie se ele também o ajudar a desmascarar o calculista Bretton James que arruinou o seu mentor, Louis Zabel.


A história de “Wall Street” (1987) mostrou ao mundo como é que a Bolsa de Valores de Nova Iorque funcionava e também profetizou que as atitudes irresponsáveis dos stocks traders norte-americanos iriam causar vários problemas no futuro. Oliver Stone não se enganou e em 2006 os Estados Unidos foram confrontados com a Crise do Subprime, uma crise financeira que foi desencadeada pelos inúmeros problemas financeiros das instituições de crédito norte-americanas. A Crise do Subprime contagiou Wall Street que sofreu bastante com as sucessivas falências bancárias e com a instabilidade do mercado, uma inconstância que acabou por provocar a Crise Financeira de 2008/2009 que alguns analistas consideram que foi tão nefasta como a Crise Financeira de 1929 (Grande Depressão). É neste contexto de crise que somos novamente apresentados a Gordon Gekko, uma personagem que é baseada nos stocks traders que criaram esta enorme confusão. Os guionistas de “Wall Street – Money Never Sleeps”, Allan Loeb e Oliver Stone, utilizaram as histórias individuais de Gordon Gekko, Bretton James, Louis Zabel, Jake Moore e Bud Fox para fazer uma crítica geral e extremamente acutilante ao actual funcionamento da Bolsa de Valores de Nova Iorque e aos seus inúmeros empregados mas também à situação actual do Mercado Financeiro Internacional que continua fortemente necessitado de regulamentos mais rigorosos e às atitudes irracionais da comunicação social que confere diariamente um mediatismo e um alarmismo exacerbado a todas as histórias ligadas ao mercado financeiro, um alarmismo que só serve para aumentar a especulação financeira que por sua vez é aproveitada por indivíduos sem escrúpulos para destabilizar e manipular livremente o mercado financeiro.


O Gordon Gekko de “Wall Street – Money Never Sleeps” é uma sombra do Gordon Gekko de “ Wall Street”, este ultimo era um homem arrogante e sem escrúpulos que utilizava diariamente o seu vasto conhecimento do mercado para enriquecer facilmente sem se preocupar com as consequências dos seus actos, uma atitude que o levou a adoptar uma filosofia de vida que assentava num simples principio – “Greed Is Good” ou “A Ganância é Boa”. O Gordon Gekko de “Wall Street – Money Never Sleeps” é um homem fisicamente e mentalmente desgastado pelo tempo que passou atrás das grades, um tempo que serviu para reabilitar a sua forma de pensar (?) e que até o levou a escrever um livro, “Greed Is Good?”, onde questiona abertamente a sua antiga filosofia de vida. Gekko também perdeu a sua imensa fortuna e a maioria da sua família que actualmente está reduzida à sua filha, Winnie, porque o seu filho morreu vítima de uma overdose e a sua esposa não aguentou a humilhação pública e acabou por o abandonar, no entanto, apesar de todas estas perdas e mudanças, ele continua a demonstrar alguns traços da sua “antiga” personalidade porque continua arrogante e manipulativo, duas características que lhe vão ser muito úteis ao longo desta história e que nos mostram que Gekko nunca poderá ser considerado um herói mas sim um vilão com algumas atitudes heróicas mas calculadas, uma ideia que é reforçada pela forma como Gekko consegue recuperar o seu antigo estatuto. O vilão desta história, Bretton James, é claramente uma versão mais evoluída e maléfica de Gordon Gekko porque este manipulava o mercado e os indivíduos que nele se encontravam mas tinha sempre o cuidado de não correr certos riscos e de respeitar certos limites que Bretton ultrapassa sem se preocupar com as suas consequências nacionais e globais. Oliver Stone e Allan Loeb utilizam Bretton James para nos demonstrar como é que um indivíduo sem escrúpulos pode utilizar as inúmeras falhas do mercado para o manipular através de boatos e rumores que, à medida que vão sendo difundidos e credibilizados pela imprensa e até mesmo por outros stock traders, vão tornando o mercado cada vez mais instável e extremamente permeável a ataques meticulosos e é assim que em “Wall Street – Money Never Sleeps” vemos como é que Bretton James utilizou a especulação financeira (completamente irracional) para levar a rentável KZI à falência e o seu CEO, Louis Zabel, ao suicídio, um caso fictício mas que é baseado em casos reais e muito recentes. Jake Moore é o stock trader mais inocente de Wall Street, este jovem ambicioso e inteligente está apaixonado pelo seu emprego e vê em Louis Zabel um exemplo a seguir, no entanto, tudo isto muda quando a KZI é comprada por Bretton James e o seu mentor se suicida, dois trágicos acontecimentos que o deixam desiludido com Wall Street e que o aproximam de Gekko que o vai ajudar a obter vingança pela morte de Zabel porque apesar de Jake ser inteligente não possui a experiencia empresarial/financeira que Gekko foi acumulando ao longo dos anos. Gekko aproveita a relação de Jake com a sua filha, Winnie, para se aproximar desta, no entanto, uma das maiores falhas do enredo de “Wall Street – Money Never Sleeps” é precisamente esta relação de Jake com Winnie porque acaba por ter um papel demasiado central no desenvolvimento desta obra e também porque a sua construção não é muito criativa.


O enredo de “Wall Street – Money Never Sleeps” é rico em momentos dramáticos, no entanto, existem alguns que são verdadeiramente importantes para a história como aqueles que nos mostram o lado mais sentimental e emocional de Gekko, um lado que só vem à superfície quando este se encontra com a sua filha. A vertente dramática também é dominada pelo suicídio de Louis Zabel, um dinossauro do mercado financeiro que não resistiu à humilhação de perder a sua empresa e que acabou por optar pelo único caminho que lhe restava. O seu suicídio é o verdadeiro catalisador do elemento narrativo mais interessante deste filme, ou seja, o confronto entre Bretton James e Jake Moore que é apoiado por Gekko, um confronto que nos mostra a verdadeira essência de Wall Street. À semelhança de “Wall Street”, “Wall Street – Money Never Sleeps”, tem uma conclusão idealista e moralmente satisfatória relativamente ao vilão da história porque Bretton acaba por ser responsabilizado pelas suas atitudes. Jake e Winnie têm um final feliz mas é Gekko que acaba por ser a maior surpresa do final de “Wall Street – Money Never Sleeps” porque este, através de uma manobra moralmente duvidosa e criminosa mas inegavelmente astuta, consegue recuperar a glória perdida em “Wall Street” e até consegue ganhar uma nova “Cath Phrase” – “What, Can’t You Believe in a Comeback?”.


O trabalho do seu realizador, Oliver Stone, é muito bom. O cineasta voltou a ser extremamente controverso com as suas críticas à sociedade norte-americana e ao Governo Americano que (ainda) não conseguiu resolver definitivamente os vários problemas que afectam a estabilidade financeira dos Estados Unidos da América, críticas essas que não são nada subtis, muito pelo contrário, são muito directas e só uma pessoa muito distraída ou pouco informada não as conseguirá compreender. O trabalho técnico deste cineasta também é satisfatório e está muito próximo daquele que nos foi apresentado por este mesmo cineasta em “Wall Street”(1987), no entanto, está longe da complexidade técnica que Stone evidenciou nos seus trabalhos anteriores. A fotografia de “Wall Street – Money Never Sleeps” é assinada por Rodrigo Prieto que através de vários cenários nos mostra um interessante contraste entre os elitistas escritórios dos stocks traders e a simplicidade dos locais onde as fortunas são feitas. O elenco desta obra é, no mínimo, luxuoso e tem em Michael Douglas o seu expoente máximo porque este veterano actor voltou a nos deslumbrar com a sua interpretação de Gordon Gekko. A performance de Michael Douglas é carismática e muito confiante, um trabalho que credibiliza a sua personagem que continua extremamente imprevisível, uma característica que também lhe é incutida pela experiência deste talentoso actor. Josh Brolin também está muito bem como Bretton James, um vilão arrogante e narcisista que Brolin interpreta sem dificuldades. A performance de Shia LaBeouf é a mais fraca dos três actores principais mas é compreensível que assim seja porque Michael Douglas e Josh Brolin são mais experientes e estão claramente noutro nível. Carey Mulligan interpreta com muita qualidade a personagem feminina mais importante deste filme, no entanto, este seu estatuto é enganador porque Winnie só se torna verdadeiramente relevante em alguns momentos da história. O cameo de Charlie Sheen como Bud Fox serve para oferecer uma conclusão à sua personagem e para mostrar ao espectador que a louvável atitude que tomou em “Wall Street” não o impediu de seguir as pisadas do seu mestre. Frank Langella também tem uma performance muito satisfatória. “Wall Street – Money Never Sleeps” é um bom filme mas não tão bom como “Wall Street”. É verdade que Oliver Stone continua controverso e que Gordon Gekko continua a ser o Rei de Wall Street mas também é verdade que se esperava um filme mais acutilante e menos melodramático.

Classificação – 3,5 Estrelas Em 5

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