domingo, 12 de setembro de 2010

Crítica - Drag Me To Hell (2009)

Realizado por Sam Raimi
Com Alison Lohman, Justin Long, Lorna Raver, Dileep Rao, Adriana Barraza

Após o enfadonho e algo desencantado “Spider-Man 3”, Sam Raimi decidiu que estava na altura de regressar ao género cinematográfico que lhe atribuiu um lugar de destaque no seio da Sétima Arte. Este é, sem sombra de dúvida, o género em que Raimi se sente como um peixe na água. Com mais liberdade para dirigir nojentas e violentas sequências onde tudo (mesmo tudo) é possível, é no género do Terror que o realizador norte-americano imortalizado pela trilogia Evil Dead encontra espaço para dar asas ao seu génio imaginativo. Numa era em que os filmes de terror cada vez mais se confundem com embrutecidos filmes de acção para públicos mais jovens, é um alívio verificar que ainda existem algumas mentes brilhantes que sabem o que é o verdadeiro terror. Indubitavelmente, como pai de um cinema de terror muito próprio, Sam Raimi é uma dessas mentes iluminadas.
De facto, este fantástico “Drag Me To Hell” vem comprovar que Raimi é um dos poucos realizadores que ainda aborda este género cinematográfico com um certo classicismo. Aqui não há pancadaria de meia-noite ao som de Ozzy Osbourne ou Marilyn Manson. Aqui não há espaço para slow-motions pirosos enquanto vemos uma bala penetrar o crânio de um monstro qualquer. Ao bom estilo do saudoso “The Evil Dead”, em “Drag Me To Hell” há apenas espaço para sequências de tensão e de asquerosidade absolutamente assombrosas, deixando bem patentes o arrojo e ousadia deste grande realizador. Um realizador que não tem medo de ir buscar referências aos clássicos filmes de terror de série B, com o intuito de criar uma obra solidamente obscura e arrepiante. E os verdadeiros e acérrimos fãs deste género cinematográfico decerto lhe estarão inteiramente agradecidos por isso.


Mas vamos à narrativa. Tal como o magnífico poster do filme nos diz, Christine Brown (Lohman) é uma rapariga com um futuro promissor. Ela tem um bom emprego, um namorado fantástico e vive o período mais apaixonante da sua vida. Porém, tudo se torna mais obscuro quando, num dia como tantos outros, ela conhece Sylvia Ganush (a arrepiante e surpreendente Lorna Raver). Desesperada e adoentada, esta pobre velhota de origem cigana desloca-se ao banco onde Christine trabalha para lhe pedir um novo adiamento da ordem de despejo que recebeu em sua casa. A princípio, Christine simpatiza com a velhota e consulta o seu chefe para saber se tal adiamento é possível de ser concretizado. Porém, numa tentativa de agradar o chefe e progredir na carreira, Christine acaba por renunciar ao pedido de Sylvia, selando o seu destino para todo o sempre. Sentindo-se humilhada pela forma como Christine a trata, Sylvia apodera-se violentamente de um dos botões do seu casaco (naquela que é uma das cenas mais espectaculares de todo o filme) e lança-lhe uma terrível maldição. Com este gesto, dentro em breve, o perverso e poderoso demónio chamado Lâmia virá para assombrá-la sem dó nem piedade… até que chegue o momento de a arrastar para as efervescentes chamas do Inferno. E se quiser escapar a este mais cruel dos fados, a jovem Christine terá de deixar para trás o seu espírito benevolente e passar pelos mais pesarosos tormentos de todos os tempos.


Estamos perante um típico filme de Sam Raimi regressado aos seus tempos de arrojada juventude sem receios do conservador comité de censura. Apesar de não apresentar a mesma criatividade, genialidade ou simples loucura dos filmes da trilogia Evil Dead, “Drag Me To Hell” acaba por se revelar bastante satisfatório. De certa forma, nota-se que Sam Raimi se acomodou aos padrões de filmagem tão típicos do cinema norte-americano. “Drag Me To Hell” não é filmado com a mesma insana frescura e irreverência dos filmes de Ash e da sua fiel motosserra (sobretudo do primeiro filme). Porém, o inconfundível cunho de Sam Raimi nota-se à distância. Raimi vê o cinema de terror como uma sólida mistura de sequências pavorosas com cenas de puro devaneio cómico. Tão depressa assistimos a cenas em que o demónio Lâmia nos aterroriza até aos ossos, como, poucos minutos mais tarde, somos presenteados com cabras falantes e olhos que disparam das órbitas das pessoas como se de balas se tratassem. Por detrás da densa cortina de negrume, Raimi reserva sempre um lugar muito especial para pequenos detalhes de pura loucura. Detalhes esses que podem deixar alguns espectadores de pé atrás, mas que os fãs do característico cinema de Raimi certamente adorarão.
“Drag Me To Hell” marca um regresso do cinema de terror ao seu estado mais puro. Não se pode dizer que se trate de um filme imensamente assustador. Trata-se sim de uma obra que provoca alguns sustos, que enoja o espectador e que o deixa a pedir por muito mais. Os jogos de som e de silêncio fazem-nos saltar da cadeira; os jogos de sombra e de luz deliciam-nos a vista; e a sublime banda-sonora de Christopher Young (também ela inspirada num certo classicismo que nos faz lembrar as arrepiantes melodias do eterno “The Exorcist”) pauta a tonalidade emocional da película de forma absolutamente brilhante. E como cereja no topo do bolo, “Drag Me To Hell” faz cair o pano com uma derradeira sequência que, mais do que surpreender-nos a nível da narrativa, assombra-nos pela forma como é arquitectada, terminando esta mais recente obra de Raimi em grande estilo.


Resumindo e concluindo, a espera foi bem longa mas este “Drag Me To Hell” vale bem o visionamento numa sala de cinema equipada com os sistemas de som mais modernos e sofisticados. Graças aos absurdos atrasos das distribuidoras portuguesas (que não hesitam em estrear porcarias como “The Unborn” ou “The Final Destination – 3D”, mas que vacilam perante obras de reconhecido interesse, deixando-nos a pensar sobre os duvidosos conhecimentos cinematográficos de quem dirige essas mesmas distribuidoras…), muitos acabaram por ver “Drag Me To Hell” em DVD. Porém, acreditem que o seu visionamento numa sala de cinema é bem mais recompensador. Pois estamos perante uma obra de puro "Raimi vintage". E como tal, os fãs do verdadeiro cinema de terror têm a obrigação de dar um salto ao complexo de cinemas mais próximo de suas casas.

Classificação – 4 Estrelas Em 5

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