Realizado por Ridley Scott
Com Russell Crowe, Cate Blanchett, Max von Sydow, William Hurt, Mark Strong
Numa altura em que todas as novidades de Hollywood se referem a novas versões/visões de heróis clássicos, quer da literatura quer da mitologia, um dos primeiros a ter direito a uma total actualização foi Robin Hood. “Robin Hood: Prince of Thieves” de 1991 de Kevin Reynolds com Kevin Costner no papel protagonista e Alan Rickman como o vilão Xerife de Nottingham foi um importante marco nos filmes de aventuras para toda uma geração, com uma crueza e frontalidade não muito frequentes no género. A época retratada era violenta, suja, corrupta e assim foi caracterizada, sem poupar no que era explicitado. As personagens eram fortíssimas, desde os papéis principais à corajosa Marion de Mary Elizabeth Mastrantonio, passando pelo mouro infiel de Morgan Freeman, com o expoente máximo talvez na bruxa Mortianna, aterradora.
Sendo eu dessa geração que este filme impressionou profundamente, esta nova versão de Ridley Scott não me trouxe nada de novo, nem ao nível técnico, nem estético, nem emotivo. A história pretende recuar um pouco mais e mostrar como nasceu a lenda de Robin Hood, de onde veio o homem e como se tornou num fora-da-lei. Tal como na versão Disney de 1973, aparecem importantes personagens tais como o Rei Ricardo e o Príncipe João. A história começa na última batalha de pilhagem dos ingleses em França. Mas o empreendimento não corre como esperado e Robin Longstride (Russell Crowe) e os seus companheiros Will Scarlett (Scott Grimes), Little John (Kevin Durand) e Allan A'Dayle (Alan Doyle) vêem-se obrigados a passar-se por cavaleiros para chegar a Inglaterra. Incumbido por um soldado moribundo de devolver a espada ao pai, Robin vai em direcção a Nottingham onde encontra Sir Walter Loxley (um espectacular Max Von Sydow), velho e cego, e a sua nora e agora viúva Marion (a sempre impecável Cate Blanchett). De relembrar que na versão de 1991 o verdadeiro nome de Robin Hood era Robin of Loxley. Aí, descobre que o velho e falido nobre conheceu o seu pai e aceita fazer-se passar pelo seu filho Robert para que Marion não perca as terras quando aquele morrer. Entretanto, há uma grande conspiração na corte perpretada pelo conselheiro do reino Godfrey (Mark Strong), cujo objectivo é fazer estalar a guerra civil para que os franceses invadam o país. Para tal, lidera uma demanda por todo o país de extorsão e chacina aos que não podem pagar os impostos, contra a qual se erguem os barões do Norte liderados por William Marshal (William Hurt), o último fiel súbdito da corte de Londres.
É um argumento bem mais político e muito mais complexo e intricado, com várias tramas e vários tipos de narração. O questionamento das Cruzadas, tendo em conta o clima político presente, foi uma abordagem muito interessante, bem como os discursos sobre a igualdade, bem contemporâneos. No entanto, isto nem sempre é uma mais valia, pois apesar da sua longa duração o filme falha com frequência em alcançar e veicular tudo aquilo que pretende. Se do ponto de vista da conspiração e dos bastidores da cena política o argumento é bastante claro e rico, do ponto de vista de afectos deixa muito a desejar, sobretudo por causa de Russell Crowe. O homem não consegue demonstrar paixão e Ridley Scott já o devia saber. Esse é outro problema, é o filme estar constantemente a lembrar-nos de “Gladiador”, quer pelas sequências muito semelhantes de luta (pela maneira como são filmadas), quer pelo protagonista e o seu exactamente igual corte de cabelo (até o guarda-roupa é parecido...). E se nesse Crowe até transparecia bem a sua ira e o seu sofrimento, aqui exprimir amor e orgulho já é mais difícil. A transição entre a rudeza de soldado, mais silencioso e subtil que os seus companheiros mas ainda assim com as suas tiradas jucosas, até ao homem sensível que vai lutar pela justiça e igualdade, que é exactamente aquilo que o filme pretende contar, capaz de proclamar filosofia a uma multidão de gente do povo, não está muito bem conseguida. Só nos convence através dos olhares progressivamente mais suaves e ternos de Cate Blanchett, desde a rudeza do seu primeiro encontro até à proclamação do seu amor, e através de retrospectivas que vai tendo da sua infância.
Em termos estéticos, as paisagens são muitas vezes filmadas à “Senhor dos Anéis”, o que dado o deslumbre que as de Peter Jackson ofereciam, não é uma escolha muito acertada a meu ver. Talvez o ponto forte de Scott tenha sido conferir realismo às personagens ao lhes retirar um certo misticismo com o qual o filme de Reynolds os envolveu. Aqui cheira-se a terra e a madeira, vêem-se as rugas e os sulcos. A caracterização das personagens foi bastante bem feita, os planos com os quais escolheu filmá-las muito acertados, talvez, quem sabe, precisamente para colmatar a falta de expressividade de alguns actores ou a falta de tempo para inserir todas as falas que contextualizariam melhor certas empatias. Mênção especial para Max Von Sydow, com uma prestação semelhante a de Peter O'Toole em “Tróia”, cheia de classe e sentimento de honra moribunda, e a um genial Frade Tuck construído por Mark Addy (“The Full Mounty”, “A Knight's Tale”, entre outros), com mais fé nas suas abelhas e no seu hidromel do que na Igreja e no seu rebanho de crentes. Convenhamos, uma revisitação a este universo mítico passados vinte anos é quase impossível de resistir, apesar de soar demasiado a tentativa de criação de saga.
Classificação - 3,5 Estrelas Em 5
Com Russell Crowe, Cate Blanchett, Max von Sydow, William Hurt, Mark Strong
Numa altura em que todas as novidades de Hollywood se referem a novas versões/visões de heróis clássicos, quer da literatura quer da mitologia, um dos primeiros a ter direito a uma total actualização foi Robin Hood. “Robin Hood: Prince of Thieves” de 1991 de Kevin Reynolds com Kevin Costner no papel protagonista e Alan Rickman como o vilão Xerife de Nottingham foi um importante marco nos filmes de aventuras para toda uma geração, com uma crueza e frontalidade não muito frequentes no género. A época retratada era violenta, suja, corrupta e assim foi caracterizada, sem poupar no que era explicitado. As personagens eram fortíssimas, desde os papéis principais à corajosa Marion de Mary Elizabeth Mastrantonio, passando pelo mouro infiel de Morgan Freeman, com o expoente máximo talvez na bruxa Mortianna, aterradora.
Sendo eu dessa geração que este filme impressionou profundamente, esta nova versão de Ridley Scott não me trouxe nada de novo, nem ao nível técnico, nem estético, nem emotivo. A história pretende recuar um pouco mais e mostrar como nasceu a lenda de Robin Hood, de onde veio o homem e como se tornou num fora-da-lei. Tal como na versão Disney de 1973, aparecem importantes personagens tais como o Rei Ricardo e o Príncipe João. A história começa na última batalha de pilhagem dos ingleses em França. Mas o empreendimento não corre como esperado e Robin Longstride (Russell Crowe) e os seus companheiros Will Scarlett (Scott Grimes), Little John (Kevin Durand) e Allan A'Dayle (Alan Doyle) vêem-se obrigados a passar-se por cavaleiros para chegar a Inglaterra. Incumbido por um soldado moribundo de devolver a espada ao pai, Robin vai em direcção a Nottingham onde encontra Sir Walter Loxley (um espectacular Max Von Sydow), velho e cego, e a sua nora e agora viúva Marion (a sempre impecável Cate Blanchett). De relembrar que na versão de 1991 o verdadeiro nome de Robin Hood era Robin of Loxley. Aí, descobre que o velho e falido nobre conheceu o seu pai e aceita fazer-se passar pelo seu filho Robert para que Marion não perca as terras quando aquele morrer. Entretanto, há uma grande conspiração na corte perpretada pelo conselheiro do reino Godfrey (Mark Strong), cujo objectivo é fazer estalar a guerra civil para que os franceses invadam o país. Para tal, lidera uma demanda por todo o país de extorsão e chacina aos que não podem pagar os impostos, contra a qual se erguem os barões do Norte liderados por William Marshal (William Hurt), o último fiel súbdito da corte de Londres.
É um argumento bem mais político e muito mais complexo e intricado, com várias tramas e vários tipos de narração. O questionamento das Cruzadas, tendo em conta o clima político presente, foi uma abordagem muito interessante, bem como os discursos sobre a igualdade, bem contemporâneos. No entanto, isto nem sempre é uma mais valia, pois apesar da sua longa duração o filme falha com frequência em alcançar e veicular tudo aquilo que pretende. Se do ponto de vista da conspiração e dos bastidores da cena política o argumento é bastante claro e rico, do ponto de vista de afectos deixa muito a desejar, sobretudo por causa de Russell Crowe. O homem não consegue demonstrar paixão e Ridley Scott já o devia saber. Esse é outro problema, é o filme estar constantemente a lembrar-nos de “Gladiador”, quer pelas sequências muito semelhantes de luta (pela maneira como são filmadas), quer pelo protagonista e o seu exactamente igual corte de cabelo (até o guarda-roupa é parecido...). E se nesse Crowe até transparecia bem a sua ira e o seu sofrimento, aqui exprimir amor e orgulho já é mais difícil. A transição entre a rudeza de soldado, mais silencioso e subtil que os seus companheiros mas ainda assim com as suas tiradas jucosas, até ao homem sensível que vai lutar pela justiça e igualdade, que é exactamente aquilo que o filme pretende contar, capaz de proclamar filosofia a uma multidão de gente do povo, não está muito bem conseguida. Só nos convence através dos olhares progressivamente mais suaves e ternos de Cate Blanchett, desde a rudeza do seu primeiro encontro até à proclamação do seu amor, e através de retrospectivas que vai tendo da sua infância.
Em termos estéticos, as paisagens são muitas vezes filmadas à “Senhor dos Anéis”, o que dado o deslumbre que as de Peter Jackson ofereciam, não é uma escolha muito acertada a meu ver. Talvez o ponto forte de Scott tenha sido conferir realismo às personagens ao lhes retirar um certo misticismo com o qual o filme de Reynolds os envolveu. Aqui cheira-se a terra e a madeira, vêem-se as rugas e os sulcos. A caracterização das personagens foi bastante bem feita, os planos com os quais escolheu filmá-las muito acertados, talvez, quem sabe, precisamente para colmatar a falta de expressividade de alguns actores ou a falta de tempo para inserir todas as falas que contextualizariam melhor certas empatias. Mênção especial para Max Von Sydow, com uma prestação semelhante a de Peter O'Toole em “Tróia”, cheia de classe e sentimento de honra moribunda, e a um genial Frade Tuck construído por Mark Addy (“The Full Mounty”, “A Knight's Tale”, entre outros), com mais fé nas suas abelhas e no seu hidromel do que na Igreja e no seu rebanho de crentes. Convenhamos, uma revisitação a este universo mítico passados vinte anos é quase impossível de resistir, apesar de soar demasiado a tentativa de criação de saga.
Classificação - 3,5 Estrelas Em 5
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