De todas as recriações que conheço da mais imortal obra de Shakespeare esta é, para mim, a mais fabulosa e aquela que mais agradaria ao autor se pudesse ver e entender os nossos tempos. Baz Luhrmann colocou a acção na fantástica cidade de Verona Beach dominada pela luta quase tribal entre duas famílias mafiosas rivais, os Montecchio e os Capuletos. Quis a sorte que os mais jovens e belos rebentos destes clãs se tomassem de amores a ponto de desafiarem tudo e todos, até a própria vida, para ficarem juntos. O argumento é, como sabemos, inigualável, o mito do amor para além da morte povoa os nossos imaginários e esse amor corporizado em duas pessoas tão jovens e inocentes ainda faz sonhar o mais insensível. Mas a obra de Luhrmann vai mais longe, actualiza os sentidos encontrando-lhes novos referentes. Juliet (Claire Danes) suicida-se com um revólver, o bom Mercutio (Harold Perrineau) é negro e Father Laurence (Pete Postlethwaite) um hippie conhecedor dos poderes mágicos das plantas. Quando Romeo (Leonardo DiCaprio) é excluído da cidade e foge para Mântua, refugia-se numa auto caravana num descampado ( a meu ver uma incongruência do filme dada a riqueza da sua família) e o Capitan- Prince (Vondie Curtis-Hall) que governa a cidade é um chefe da polícia. A coerência desta adaptação é absolutamente notável nos mais ínfimos pormenores. Também a a banda sonora de Nellee Hooper serve muito bem a ideia que comanda a versão bem como o argumento de Craig Pearce que, embora seja uma adaptação muito livre da obra original, segue fielmente o espírito do texto de Shakespeare, o que confere uma dimensão poética e trágica ao filme dificilmente alcançável se a opção fosse a reconstituição histórica. Mas a figura principal é Romeo a quem DiCaprio soube dar a cândida virilidade exigida pelo papel. Em suma, embora polémico, este filme absolutamente pós-modernista, é a maior homenagem que o cinema contemporâneo podia fazer ao dramaturgo isabelino e uma marca na nossa memória colectiva.
Classificação - 5 Estrelas Em 5
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