Com Hilary Swank, Gerard Butler, Gina Gershon, Lisa Kudrow, Gina Gershon
Pensava eu antes de ir ver P.S.,Amo-te: "P.S.Amo-te, a estrear em Portugal em pleno dia dos namorados, pode parecer apenas mais um produto de consumo rápido. A verdade no entanto é que tem um belo argumento, escrito pelo próprio realizador em colaboração com Steven Rogers e inspirado no romance de Cecelia Ahern.". Uma ténue esperança (ingenuidade…) fazia-me acreditar que este seria um daqueles filmes para recordar. Não foi desta. A verdade é que não tive surpresa. Infelizmente, P.S., Amo-te pouco nos traz de novo, num género já bastante desgastado e cada vez mais direccionado a determinados tipos de público. Este é um daqueles filmes que só a indústria de Hollywood nos podia dar: banalidade elevada ao estatuto de "arte" ou, brincando com as palavras associadas ao escritor inglês D.H. Lawrence, um Taj Mahal erguido no lugar de uma simples queca. As perguntas que encabeçam este texto são retóricas é certo, mas a indignação que as sugere é verídica. Depois de ser simpaticamente arrastado para a estreia de mais um belo filme de Dia de São Valentim (não me lembro de outra etiqueta), várias ideias pré-concebidas me vieram à memória. Primeiro ponto, motivo da anunciada indignação: P.S., Amo-te; segundo ponto, vamos à história de mais esta farrusca declaração de amor.
Holly Kennedy (Hilary Swank) é bonita, inteligente e casada com o amor da sua vida: Gerry (Gerard Butler), um apaixonado, divertido e impetuoso irlandês. Quando Gerry morre, a vida de Holly parece também ter terminado, a sensação de vazio é naturalmente arrepiante. A surpresa surge, contudo, no dia do seu 30º aniversário, um ano após a morte do seu marido. Juntamente com um bolo de aniversário, Holly recebe uma cassete gravada por Gerry, com sugestivas instruções para que esta embarque num jogo curioso, com etapas de realização bem definidas pelo próprio Gerry antes de morrer, em forma de cartas. Gerry escrevera a Holly várias cartas que a ajudarão a reencontrar a alegria de viver ou, pelo menos, uma nova força. Nas semanas e meses seguintes Holly recebe novas cartas, entregues de formas surpreendentes, que terminam todas com um P.S., Amo-te, a relembrá-la do seu amor. Cada carta é um passo em frente no processo de recuperação de Holly, que lentamente volta a acreditar na felicidade.
A premissa é, no mínimo, curiosa – não fosse o filme baseado num best-seller literário –, a presença de Hillary Swank também é prometedora – a actriz alcançou um estatuto de relevo com o OSCAR de 2005 por Million Dollar Baby –, porém, nada pode salvar a convencionalidade da realização ou a sensaboria da narrativa. Esquecendo um pouco o simples facto de se tratar de um filme à là Hollywood (o que implica entrarmos um pouco num estado zen e suspendermos a nossa crença no real – esquecendo naturalmente as contingências da vida prática, como o atraso do correio ou a certeza de que as coisas não acontecem de um momento para o outro), são vários os aspectos que transformam este filme em mais um exemplo de como dificilmente o cinema europeu chegará ao nível do cinema de Hollywood. A verdade é que Hollywood tem uma máquina de milhões de dólares tal que consegue transformar frases tão cheias de banalidades em excelentes exercícios de retórica, fórmulas cinematográficas com dezenas e dezenas de anos em produtos frescos, que aparentemente nunca se gastam. Repare-se na tradição do filme melodrama – subgénero, ou género, tão em voga nos anos 50 com um Douglas Sirk por exemplo – e na forma como actualmente vai surgindo com novos conceitos e exemplos, sem que lhe seja atribuída a etiqueta "kitsch" ou "rasca". Se virmos bem, P.S., Amo-te não é mais que um Written on The Wind (Sirk, 1956) ou um All That Heaven Allows (Sirk, 1955). Este P.S., Amo-te continua a ter os mesmos ingredientes que todos aqueles filmes celebrizados em diferentes décadas do cinema de Hollywood. Mais estilizados e actualizados é certo, mas continuam a responder às mesmas fórmulas, critérios e ritmos. Mais ainda, continua a servir como simples escapismo para assuntos mais pesados… aqui é a morte. Temos, de certa forma, a partir do momento em que entramos na sala de cinema, uma imediata suspensão da realidade, do sentimento de vida real, das dificuldades de uma relação entre casal ou seres humanos. No cinema o "Amo-te" ou, mais convenientemente, o "I love you", continua a ser bem mais bonito do que na vida real. O filme de LaGravenese – realizador quase estreante não fosse o seu segmento de Paris, Je t'aime ou Freedom Writer também com Hillary Swank –, acaba assim por ser uma celebração dessa suspensão da realidade, pouco mais. É precisamente aqui que entra o choque tremendo com o cinema europeu como um todo. Na Europa – por falta de meios ou, como nós europeus gostamos de acreditar, por privilegiarmos a arte em vez do box-office –, as contingências da vida diária fazem parte do cinema. Um filme como P.S., Amo-te seria altamente impossível de fazer por estes lados, pelo menos não com a dimensão fluida como este tem – um filme tão certinho (é mesmo o termo), tão convencional e tão fantasioso seria reduzido à caricatura por aqui. É certo que um certo cinema francês, ou espanhol mesmo, começa a querer aproximar-se da fluidez narrativa dos filmes americanos, mas, mesmo aí, é difícil ter semelhante resultado, já que a fórmula americana já está de tal forma trabalhada que a coisa mais ridícula parece brilhante na tela. Com estas palavras pareço privilegiar o cinema de Hollywood em detrimento do cinema europeu. Não faço tal exercício, mas admito que lamento que a arte que domina o mercado mundial seja a que sai da mainstream Hollywood. Contudo, é incrível a forma como o cinema de estúdio continua a jogar tão brilhantemente com as nossas emoções. Por vezes, acredito mesmo que a indústria americana encontrou a fórmula das emoções humanas, já que cada filme consegue agarrar no ponto chave de cada audiência, fazendo-nos entrar numa montanha russa sempre em desenvolvimento e actualização. Repare-se, por exemplo, no recente I am Legend de Francis Lawrence e na forma como mais um blockbuster – por muito mau que seja –, consegue, cada vez de forma mais sofisticada, preencher todas as nossas emoções, fazendo-nos sentir emoções tão extremas como medo ou alegria em questões de minutos. Seguindo esta linha de pensamento, colocaria par a par filmes tão extremos, no que toca ao argumento, como I am Legend e P.S.,Amo-te. Ambos são paradigmáticos das diferenças entre a indústria americana e o filme europeu em geral, mesmo considerando o cinema europeu mais comercial. Tanto um quanto o outro, apesar de serem produtos direccionados a públicos diferentes, procuram surpreender – apostando essencialmente em argumentos bem adaptados e interpretações mais ou menos seguras – dentro de géneros cada vez mais saturados, com técnicas revistas e efeitos emocionais que se pretendem genuínos. Focando-me essencialmente em Amo-te, acredito ser notória a forma como o filme procura impedir que o drama ocupe a tela, ou seja, temos na tela um "weepie" (o tal filme lamechas) disfarçado de comédia romântica ou, simplesmente, de comédia. Bem nos momentos em que a banalidade tende a incorrer em lágrimas ou momentos mais intensos, eis que chega um pronto "comic relief" a arrastar a audiência para a gargalhada. O resultado final é então um filme artificial, banalizado e caricatural. Porém, parece resultar para o público em geral. As gargalhadas seguem-se de lágrimas e vice-versa. Na minha retina ficará a interpretação de Hillary Swank (ao nível de Diane Keaton por Alguém tem de Ceder) e, sobretudo, pelas personagem ridículas interpretadas por Harry Connick Jr. (Daniel Connelly) e pela "Phoebe" de Friends, Lisa Kudrow (Denise Hennessey) – humor hilariante de ambas é certo, mas que resulta em total caricatura no filme, quase servindo como alerta para a audiência não se deixar adormecer. O pior é que eu próprio me deixei levar nesta montanha russa de emoções ou será a espera pelos Irmãos Coen?
Classificação - 2 Estrelas Em 5
0 comentários :
Postar um comentário