domingo, 13 de fevereiro de 2011

Crítica - The King's Speech (2010)

Realizado por Tom Hooper
Com Colin Firth, Geoffrey Rush, Helena Bonham Carter, Guy Pearce, Michael Gambon

“The King’s Speech” esteve muito perto de se tornar uma peça de teatro para os palcos londrinos. Foi com esse destino em mente que o primeiro guião foi escrito. E talvez isto explique muitas das limitações (artísticas e narrativas) que o filme acaba por apresentar. Foi através de Geoffrey Rush que a outrora peça teatral se transformou, definitivamente, num projecto de cinema. Diz-se que o actor australiano ficou de tal forma siderado com o guião que tinha em mãos, que não hesitou em deitar mãos à obra e tornar-se produtor executivo de uma obra cinematográfica que acabaria por arrecadar 12 nomeações para os Óscares da Academia. O problema é que, em muitos aspectos, “The King’s Speech” continua a obedecer cegamente aos padrões artísticos e narrativos de uma peça teatral. O grande trunfo do filme está na excelência dos diálogos e nas brilhantes interpretações dos seus protagonistas (com destaque máximo para Colin Firth e Geoffrey Rush, os dois actores que acabam por carregar quase todo o filme às costas). Mas para além disso, muito pouca coisa salta à vista, numa obra onde o excesso de convencionalismo chega mesmo a irritar e onde nada (bom, quase nada…) consegue surpreender o espectador e oferecer-lhe algo de verdadeiramente extraordinário. A sensação com que se sai da sala é a de que já se viu isto montes de vezes. A história em si é original, é um facto. Mas a forma como essa história é contada mergulha fatalmente num conservadorismo narrativo ultra-enfadonho, SPOILER onde todos sorriem para a câmara no final e até a clássica mensagem do “foram amigos para sempre” não escapa. O que me deixa a pensar seriamente em como raio é que um filme como “The King’s Speech” consegue obter 12 (!) nomeações para os prémios mais conceituados do cinema.


A narrativa não é muito complexa. O príncipe Albert, Duque de York (portentoso Colin Firth), sempre apresentou problemas de gaguez. Sendo um membro da família real e um dos herdeiros ao trono britânico, ele é obrigado a falar em público e, por isso, recorre aos serviços de inúmeros terapeutas da fala (uns melhores que outros) com o intuito de resolver o problema que tantas dores de cabeça e fortes embaraços lhe tem oferecido. O insucesso é de tal forma gigantesco, que Albert acaba por renunciar a todo o tipo de tratamentos, conformando-se com a inevitabilidade da sua triste situação. A sua esposa Elizabeth (Helena Bonham Carter), porém, não aceita a sua desistência e continua à procura de um talentoso terapeuta da fala que possa realmente ajudar o seu atormentado marido. É então que Lionel Logue (surpreendente Geoffrey Rush) – um terapeuta de métodos pouco vulgares – entra em cena. Renitente numa primeira fase, Lionel lá adiciona Albert à sua lista de clientes, aceitando tratá-lo segundo as regras e condições impostas por alguém pertencente a um cargo de tão notável distinção. E assim começam as peculiares sessões de terapia da fala entre Lionel e Bertie. Sessões que decorrem com um sentido de urgência cada vez mais apurado, já que a guerra com a Alemanha de Hitler se aproxima a passos largos e Albert está cada vez mais próximo de se transformar no Rei George VI. Um cargo que o obrigará a discursar perante todos e, mais do que isso, um cargo que o forçará a incutir confiança num povo amedrontado pela ameaça da segunda guerra mundial. E tudo isso através das palavras, suas inimigas de longa data…
Que fique bem clara a noção de que “The King’s Speech” não é um mau filme. As sessões de terapia da fala (sem sombra de dúvida, os momentos mais irreverentes e brilhantes da película, únicos instantes onde esta desperta de um modo de filmar pré-fabricado e nos oferece pormenores de realização bem conseguidos) colam-nos os olhos à tela e as interpretações dos actores fazem-nos acreditar na veracidade das respectivas personagens. Colin Firth pode, desde já, preparar o discurso para os Óscares, pois, a menos que aconteça alguma desgraça, a sua arrepiante interpretação do príncipe Albert irá cobri-lo de ouro e glória na noite de 27 de Fevereiro. Também Geoffrey Rush se destaca sem grande esforço, oferecendo-nos uma interpretação que tem tanto de cómica como de comovedora. Helena Bonham Carter é que acaba por passar mais despercebida, muito por causa do seu papel não atingir o nível de profundidade dramática que o duo de protagonistas atinge. Mais conhecido pelo trabalho efectuado na mini-série “John Adams” (bastante apreciada nos Estados Unidos) e no filme “The Damned United”, Tom Hooper oferece-nos assim uma obra sóbria, elegante e deveras eficaz na transmissão da sua mensagem.


Contudo, na minha opinião e como já tive oportunidade de referir, isto é muito pouco para uma obra que se pretende afirmar como a melhor de toda uma temporada cinematográfica. Uma película presenteada com o Óscar de Melhor Filme do ano deve ser uma película que nos surpreenda, que nos marque pela sua originalidade e arrojo artístico, que nos fique gravada na memória por muitos e bons anos. E isto é algo que “The King’s Speech” está muito longe de fazer. Se não soubéssemos melhor, diríamos que este é um filme de Ron Howard, dirigido sob a chancela da Walt Disney para toda a família. O convencionalismo que lhe é inerente e a forma demasiado certinha e linear com que se desenvolve, transformam esta obra em algo de profundamente banal e dispensável. Nada surpreende, tudo se passa conforme estamos à espera e a narrativa desagua numa previsibilidade que não abona em favor de ninguém. Muito sinceramente, esperava muito mais deste “The King’s Speech”. Tudo se desenrola de acordo com o “manual de fazer filmes” de que Hollywood tanto gosta, razão pela qual o filme acabou por encabeçar a lista de nomeados para os Óscares. Mas algo me diz que o único Óscar que lhe vai sair na rifa é o de Melhor Actor Principal. E se houver justiça neste mundo, esperemos que assim seja, pois “The King’s Speech” assemelha-se mais a um telefilme que se vê numa tarde de Domingo.

Classificação – 3,5 Estrelas Em 5

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