Criada por David Simon, Ed Burns, etc.
Com Dominic West, Wendell Pierce, Clarke Peters, etc.
The Wire é, provavelmente, a melhor série que, até à presente data, a HBO deu ao mundo. E sim, tenho em mente essoutro colosso do pequeno ecran, de seu nome Sopranos. A genialidade de The Wire é o autêntico "murro no estômago" em que consiste. Sem contemplações, hedonismos lacrimejantes, know how plástico que tudo filtra como se de um gigantesco anúncio se tratasse, moralismos de algibeira numa hipocrisia desmesuradamente isenta da salutar vergonha.
E que pequena amostra desse universo designado humanidade elegeram os criadores da série para húmus e repasto da sua obra? A bela cidade de Baltimore. A cidade e os seus habitantes, pelo prisma das instituições: dos dealers e seus complexos esquemas organizacionais, passando pelo tráfico portuário, piscando o olho à política também como o típico lavadouro universal de alguns dos dinheiros sobejantes do crime, as escolas onde nem mesmo em idade púbere se almeja levar a salvação do conhecimento a quem esbraceja desde sempre para sobreviver entre o caos, e, finalmente, os jornais, estrangulados pela era do digital, conspirando para uma massificação da informação cada vez mais alheia à verdade que importa de facto contar ao leitor. Cada uma destas instituições é abordada em cada temporada da série. Ou seja, 5 magnas temporadas para ver e rever!
Pelo que já se disse parece coisa das boas, não? Pois, mas o ponto forte ainda está por mencionar: as personagens. The Wire é, de longe, muito longe, a melhor série do ponto de vista das personagens criadas. São de carne e osso, contradizem-se, não há vilões de absoluta maldade, ou mesmo relativa... um dos mais eminentes (Omar) rege-se por um código de valores capaz de superar o de muitos bons chefes de nação - isto, claro, abstraindo o facto de ser um gangster que mata dealers... Não há Budas nem santos, todos eles pecam e ostentam defeitos. Humanas, demasiado humanas... profundas e complexas, balzaquianas, como alguém doutamente o fez notar. Para apresentá-las em devida ordem teria de mencionar umas quantas antes das duas que mais fascinaram, por isso, arbitraria e autoritariamente, destaco:
Omar Little (Michael K. Williams) - Nos seus early 30's, Omar é uma lenda viva nos bairros degradados de Baltimore. Dedica-se ao roubo de dealers, coisa tão idónea à longevidade como pastéis de cicuta ao pequeno almoço. Mas não se trata de um criminoso qualquer. Tem um código e segue determinadas condutas de acordo com uma escala de valores muito própria.
Diz o próprio Omar que nunca apontou a sua arma a nenhum civil, o que é verdade.
Omar é homossexual, abomina palavrões e é generoso e honrado.
Brother Mouzone(Michael Potts) - Um vilão do outro mundo! Enverga fato e laço, homem culto e informado “with more bodies on him than a chinese cemetery”, como bem o caracteriza o Prop. Joe (outra personagem 5*), em meio pestanejo devia o olhar dos seus livros e revistas para gente com massa encefálica funcional e adiciona às estatísticas da medicina legal os itens devidos.
Ah! Só mais uma coisa: The Wire não é a típica série dramática. Há por lá cenas (em todos os episódios, nalguns até mesmo muito) de uma piada extraordinária! Devo dizer que já me ri mais com certos episódios de The Wire do que com alguns de Weeds. E Weeds tem um humor bem lá à frente. A diferença é que a façanha do cómico não é artificial. Ela é antes potenciada pela imperiosa e omnipresente realidade humana, sem plasticidades e estéticas adulteradas. Aqui seguem dois exemplos daquilo que quero dizer com humor de ponta numa série dramática: o desenvolvimento e súbito insight na investigação de dois detectives e os desvarios de uma típica bebedeira de um bófia desgovernado (atenção que tem cenas para adultos, daquelas idóneas a produzir gente pequena). Só a realidade que oprime alberga a redenção. E constatar que ainda se fazem coisas extraordinárias como The Wire é redentor. Pelo menos para quem goste de ver boa televisão.
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Classificação - 4,5 Estrelas Em 5
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